Frederico Duarte é o camisola 10 do histórico Wisla: "Quero ajudar o clube a voltar ao patamar mais alto"

Frederico Duarte em destaque na Polónia
Frederico Duarte em destaque na PolóniaBruno Opoka/Wisla Kraków

O Wisła Cracóvia é o quarto clube mais titulado da Polónia, mas está afastado do principal escalão desde 2022. O regresso parece agora mais próximo do que nunca e, em entrevista exclusiva ao Flashscore, o português Frederico Duarte fala do seu papel nesse caminho e da sua jornada de sucesso no estrangeiro.

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O futebol nem sempre é um caminho retilíneo e perfeito. Há curvas, dúvidas… mas a paixão move montanhas.

O nome de Frederico Duarte pode não ser reconhecido pela grande maioria dos adeptos portugueses, mas o jogador português tem feito história além-fronteiras, elevando o seu futebol em países como a Grécia e, mais recentemente, a Polónia.

Após muitos e bons anos na formação do Sporting, Frederico acabou por sair para o Sacavenense no último ano de júnior. Não atirou a toalha ao chão. De Sacavém a Vila Franca de Xira, onde, após uns meses, deu o salto para o Panetolikos, da Grécia, clube no qual construiu uma carreira sólida durante cinco anos.

Despediu-se como o terceiro jogador com mais jogos da história do emblema grego e mudou-se para Cracóvia, para vestir a icónica camisola 10 e ajudar o histórico Wisła a regressar ao patamar mais alto do futebol polaco.

Hoje é um dos jogadores mais acarinhados - o salto mortal que faz na celebração dos golos, em homenagem ao seu passado de ginasta, “ajuda” no carisma - e o foco é só um: subir de divisão.

Médio português joga num dos clubes mais titulados da Polónia
Médio português joga num dos clubes mais titulados da PolóniaMarcin Golba/NurPhoto / Shutterstock Editorial / Profimedia

"O Wisła é um dos clubes com maior expressão em toda a Polónia"

- Esta é a sua segunda época na Polónia. Como é que tem vivido esta nova aventura?

Tenho gostado muito da experiência. O primeiro ano, sobretudo os primeiros cinco ou seis meses, foi um pouco mais difícil em termos de adaptação, principalmente por causa do clima e das pessoas. Eu vinha da Grécia, que tem um clima completamente diferente. Ainda assim, depois desse período adaptei-me bem e, nesta segunda época, as coisas têm corrido muito bem. Tenho vindo a gostar cada vez mais do país, que me agrada bastante, e a cidade onde estou também é muito boa.

- O Wisła é um clube histórico, o quarto mais titulado da Polónia, embora esteja a atravessar uma fase diferente, na segunda liga desde 2022. O que mais o atraiu neste novo projeto?

Na altura estava à procura de uma experiência nova, tinha terminado contrato e surgiram oportunidades em vários países. O Wisła, enquanto clube, já era bem conhecido para mim. Sempre ouvi falar muito bem, é um histórico da Polónia, com muitos títulos e uma massa adepta muito forte, e isso teve logo um grande peso na decisão. Depois houve também a forma como o clube me abordou: explicaram-me que eu teria um papel importante na equipa e que poderia ajudar o Wisła a ultrapassar esta fase mais difícil dos últimos anos e a voltar ao patamar que merece. Foi um conjunto de fatores que me cativou, mas a dimensão do clube, a sua estrutura e os adeptos acabaram por tornar a decisão bastante natural.

Frederico Duarte deixa elogios aos adeptos do Wisla
Frederico Duarte deixa elogios aos adeptos do WislaOpta by Stats Perform, Wisla Kraków

- A expectativa já existia antes de ir para a Polónia. Mas quando chegou, o que é que mais o impressionou no clube e na sua história?

Eu já ia com a noção de que ia encontrar um clube grande, com muitos adeptos e um centro de treinos de topo. No entanto, só quando cheguei é que percebi verdadeiramente a dimensão do Wisła e a força que tem na Polónia. O clube deu-me todas as condições desde o primeiro momento e isso acabou por me impressionar bastante. A verdade é que, antes de irmos, temos sempre uma ideia formada, mas só estando lá é que se percebe o impacto real do clube, a sua história, as pessoas à volta e a forma como a cidade vive intensamente o Wisła.

- Para quem não conhece a realidade do Wisła Cracóvia, estamos a falar de um clube que está atualmente na segunda divisão, é certo, mas que em termos de adeptos vive uma realidade completamente diferente. É mesmo assim?

Sem dúvida. Podemos dizer que é quase uma loucura. Os adeptos vivem intensamente para o clube e o próprio Wisła vive muito deles. Têm sido fundamentais para aguentar o clube, sobretudo neste período mais difícil. É verdade que, neste momento, não estão no patamar que merecem, mas durante muitos anos o Wisła foi um dos clubes de topo na Polónia. Ou ganhava, ou lutava pelo título, ou marcava presença nas competições europeias. Sempre foi um clube ambicioso e os adeptos tiveram um papel decisivo nesse crescimento.

- Estamos a falar de quantos adeptos, em média, por jogo?

O nosso estádio tem capacidade para cerca de 30 mil pessoas e, esta época, temos uma média a rondar os 24 a 25 mil adeptos por jogo. Tendo em conta que se trata da segunda liga, é algo completamente fora do normal. Mas, quando se está lá e se sente o clube por dentro, percebe-se facilmente essa realidade. As pessoas vivem intensamente o Wisła e o clube tem um peso enorme, não só na cidade, mas também a nível nacional. Arrisco dizer que é um dos clubes com maior expressão em toda a Polónia.

- Esta época as coisas estão a correr muito bem e a equipa segue na liderança. Como é que tem sido a sua relação com as pessoas, sobretudo tendo em conta que enverga a camisola 10, um número sempre muito especial? 

No início há sempre esse impacto e esse peso associado à camisola, porque o número 10 cria naturalmente expectativas. Para nós, jogadores, é uma pressão boa, que acaba por nos motivar. Eu vinha da primeira liga grega, com um percurso consistente, e isso também fez com que as pessoas esperassem bastante de mim. Foi preciso um período de adaptação, porque é um futebol diferente, num contexto e numa cultura também diferentes. Hoje em dia, sinto que, de uma forma geral, as pessoas gostam de mim. Fui muito bem recebido, continuo a sentir-me muito bem no clube e, especialmente nesta fase em que a equipa está a atravessar um bom momento, sinto que também estou numa fase muito positiva.

Os números de Frederico Duarte
Os números de Frederico DuarteFlashscore

- Que tipo de jogador é hoje? Tendo em conta também esta exigência dos adeptos e a pressão adicional de jogar, em média, perante mais de vinte mil pessoas, o que é que sente que mudou em si desde que chegou à Polónia?

Sem dúvida que isso se sente. Há sempre aquele friozinho antes dos jogos, porque sabemos que vamos encontrar o estádio cheio e um ambiente incrível. Mesmo nos jogos fora, nota-se que a nossa presença mobiliza muita gente. As equipas sentem que vai entrar em campo um clube grande e os estádios costumam estar muito compostos. Para mim, individualmente, isso acaba por ser um estímulo extra. Gosto desse tipo de pressão e acredito que é para isso que jogamos futebol. Faz parte do espetáculo que oferecemos às pessoas e, quanto mais gente estiver a ver, maior é a motivação para dar o nosso melhor.

- Já se vê alguma bandeira portuguesa ou alguma camisola 10 com o seu nome nas bancadas?

Sim, de vez em quando vou vendo. Tento não me distrair muito durante os jogos, mas às vezes reparo em algumas bandeiras ou camisolas com o meu nome. É sempre bom ver isso, porque acaba por ser um sinal de que as pessoas estão a gostar do meu trabalho. É algo que dá prazer e que, confesso, tem a sua piada.

Frederico Duarte cumpre a segunda época no Wisla
Frederico Duarte cumpre a segunda época no WislaEwa Michalik/Wisla Kraków

O regresso à Ekstraklasa: "Sentimos que estamos mais perto do que nunca"

- O Wisła chega a esta paragem com nove pontos de vantagem sobre o segundo classificado, o que faz crescer a expectativa dos adeptos em relação ao regresso à primeira divisão. Como é que o grupo está a viver esta luta pelo grande objetivo? Acreditam que pode ser este o ano?

É claro que toda a gente no clube - jogadores, equipa técnica e toda a estrutura - sente que estamos num caminho muito positivo. Não é normal chegarmos a esta fase da época, perto do Natal, com uma vantagem tão significativa. Isso dá-nos confiança, mas também exige responsabilidade. Sabemos bem como é o futebol: tudo pode mudar rapidamente e, por isso, não há espaço para relaxar. Ainda vamos a meio da época, mas é evidente que sentimos que estamos mais perto do que nunca. Conhecemos as nossas capacidades, vamos continuar a dar o máximo e, se for possível resolver o objetivo o mais cedo possível, melhor. Caso contrário, lutaremos até ao fim, sempre com foco e sem desleixar.

- E como é que está a viver esta fase a nível mais pessoal? Em termos de números, já superou o registo de assistências da época passada e está muito perto de ultrapassar a marca de golos. Este ano, além disso, fez o seu primeiro hat-trick na Polónia.

É verdade, foi o primeiro hat-trick da minha carreira profissional. A nível individual, estes últimos meses têm sido positivos e sinto que tenho conseguido estar ao nível que pretendo. Claro que há sempre margem para melhorar e essa vontade está sempre presente, mas, em termos de números, o balanço tem sido claramente positivo. O mais importante é continuar a crescer e a evoluir. Quando a equipa está bem, os jogadores acabam por beneficiar individualmente, e acredito muito que este momento também resulta da força coletiva do grupo. Se continuarmos assim, todos têm tendência a sobressair.

- O que é que tem feito a diferença, sobretudo a nível de grupo? Que característica destacs como decisiva para este momento da equipa?

Acho que existe uma base muito sólida que já vinha da época passada. Mantivemos essa base, apesar de algumas mudanças no plantel, e o treinador teve um papel importante nisso. Somos um grupo muito unido, não há divisões nem pequenos grupos. Temos uma relação muito próxima entre todos e isso depois reflete-se dentro de campo. Nota-se a ligação que existe, a forma como lutamos uns pelos outros, jogue quem jogar. Num desporto coletivo, isso é fundamental. O entrosamento, a união e a força do balneário fazem toda a diferença, e sinto que aí somos muito fortes. É algo que queremos manter até ao fim da época.

Wisla segue na liderança da tabela classificativa
Wisla segue na liderança da tabela classificativaFlashscore

- Olhando para o seu percurso, percebe-se que é um jogador que aposta na estabilidade dos projetos. O Frederico estás agora na segunda época no Wisła, com contrato até 2027, e o grande objetivo passa pela subida à primeira liga. Para os adeptos, que começam a identificar-se cada vez mais consigo, como imagina o seu futuro no clube? Passa por subir e acompanhar o clube nesse salto?

Sim, claramente. Esse foi, desde o início, um dos grandes objetivos que me trouxeram para aqui: ajudar o clube a subir e a voltar ao patamar mais alto do futebol polaco, onde o Wisła merece estar. Quero muito fazer parte desse processo e dessa experiência, caso consigamos a subida. Vejo-me a continuar no clube durante vários anos. Sinto-me bem aqui, fui muito bem recebido, a minha família está feliz e isso é fundamental. Neste momento, a minha cabeça está totalmente no Wisła e no que ainda podemos construir juntos.

- E como é que é viver em Cracóvia?

A verdade é que foi uma surpresa muito positiva. Já tinha estado na Polónia, mas nunca tinha visitado Cracóvia com tempo para a conhecer verdadeiramente. No dia a dia, é um país onde tudo funciona. A cultura é bastante diferente da portuguesa e, à primeira vista, as pessoas podem parecer um pouco mais frias. No entanto, com o tempo percebe-se que são boas pessoas, simplesmente menos expansivas do que estamos habituados em Portugal. É um país limpo, seguro e onde me sinto muito bem. Cracóvia, em particular, é uma cidade muito agradável para viver.

Frederico emigrou aos 19 anos
Frederico emigrou aos 19 anosČTK / imago sportfotodienst / Marcin Solarz/FotoPyK

Regresso a Portugal? "Não é prioridade imediata, mas penso nisso"

- O Frederico fora de Portugal desde 2019. Jogar longe de casa mudou, de alguma forma, a forma como vê o futebol e a própria vida? O que é que sentes que mudou em si desde então?

Enquanto pessoa, sinto que mudei bastante, mais até do que propriamente como jogador. Saí de casa muito novo e tive de me adaptar cedo à distância, a viver sozinho e a estar muito tempo fora do meu país. Isso obrigou-me a crescer mais depressa e a tornar-me mais responsável.

Essa experiência acabou por me moldar, tanto a nível pessoal como profissional. Ganhei uma bagagem importante, não só em termos de futebol, mas também de vida, e isso ajudou-me bastante nas diferentes adaptações que fui tendo, incluindo agora na Polónia.

Acho que faz parte desta profissão termos experiências fora, conhecermos novas culturas, países diferentes e outras realidades. É algo de que gosto e que sinto que me tem feito bem, ajudando-me a crescer em todos os sentidos.

Frederico falou sobre um possível regresso a Portugal
Frederico falou sobre um possível regresso a PortugalOpta by Stats Perform, Wisla Kraków

- Antes de recuarmos ao início da sua carreira, gostava ainda de lhe perguntar: ao longo destes anos, o “bichinho” de jogar num campeonato profissional em Portugal nunca despertou? 

Sim, é algo em que penso e que ambiciono. Acompanho sempre o campeonato português e os jogos, por isso esse “bichinho” de regressar a Portugal nunca desapareceu. Neste momento, não é algo que tenha como prioridade imediata, mas, se surgir uma oportunidade, claro que teria todo o gosto em regressar. Além de estar mais perto da família, gostava muito de ter a experiência de jogar na Primeira Liga em Portugal.

- Para quem acabou por perder um pouco o seu rasto, quem é hoje o jogador Frederico?

Hoje em dia, sinto que sou um jogador que se enquadra sobretudo nas posições de número 10 ou de extremo esquerdo a jogar por dentro. Ao longo da carreira fui-me adaptando e encontrando cada vez mais conforto nessas zonas do campo. Quando era mais novo, atuei mais vezes como extremo puro, mas atualmente sinto-me mais à vontade em zonas interiores, onde consigo estar mais ligado ao jogo. Sou um jogador de cariz ofensivo, que gosta de ter bola e de participar na construção e na definição das jogadas.

Frederico cumpriu grande parte da sua formação no Sporting
Frederico cumpriu grande parte da sua formação no SportingArquivo Pessoal

Formação no Sporting: "Anos muito felizes na minha vida"

- Puxemos a fita para trás. Qual é a primeira memória que tem do futebol?

Comecei no futebol muito cedo e a minha primeira memória leva-me imediatamente ao Sporting. Fiz toda a minha formação no clube, entrei com sete anos e fiquei até aos juniores, saindo aos 18. As memórias de infância estão todas muito ligadas a esse percurso: começámos em Pina Manique, passámos pela Cidade Universitária e, mais tarde, por Alcochete. Fiz esse caminho todo e foram anos muito felizes da minha vida, que guardo com enorme carinho. Quando olho para trás, só me traz boas recordações.

- O Sporting foi uma parte muito importante do seu percurso, onde passou muitos anos e conviveu com muitos jogadores, alguns que chegaram ao topo, outros que seguiram outros caminhos, como acontece em tudo na vida. Se tivesse de destacar dois ou três aspetos marcantes dessa passagem, quais seriam?

Acima de tudo, o Sporting moldou-me como pessoa. Ensinou-me a responsabilidade e tudo o que envolve a vida de um atleta, desde muito cedo. Muitas vezes temos de abdicar de coisas a nível social ou de momentos com amigos para colocar o futebol em primeiro lugar, e isso faz parte do processo.

Essa exigência ajudou-me a crescer mais rápido e acabou por ser uma base muito importante para as adaptações que fui tendo ao longo da carreira, sobretudo quando comecei a jogar fora de Portugal, em contextos diferentes e com outras culturas.

Outro aspeto fundamental foi a importância dada ao grupo e à união, que eles continuam a valorizar muito. Viajávamos muito em equipa, havia um forte espírito coletivo e isso era sempre muito trabalhado. Essa cultura de balneário e de entreajuda foi algo que o Sporting me transmitiu e que continuo a valorizar muito hoje.

- Mas nem tudo foi positivo. O Frederico chega a uma fase decisiva da formação, talvez uma das mais importantes, e acaba por ser emprestado ao Sacavenense. Para um jovem que tinha passado praticamente toda a vida no Sporting, como é que foi lidar com esse momento?

Foi uma fase de decisões difíceis. Era novo e, naturalmente, achamos sempre que conseguimos dar mais e chegar mais longe. Tinha passado muitos anos no Sporting, estava habituado a um contexto muito protegido, com todas as condições, quase como se estivesse tudo preparado.

De repente, tive de tomar uma decisão importante e sair desse conforto. Na altura não foi fácil, mas senti que podia ser o melhor para mim, porque teria mais espaço, mais oportunidades para jogar e para crescer. E isso podia ajudar-me, quer num eventual regresso ao Sporting, quer, como acabou por acontecer, a dar o salto para outro projeto.

Claro que, olhando para trás, podemos sempre pensar no que poderia ter sido feito de forma diferente, mas não gosto muito de viver nesse exercício. Vejo esse momento como um ponto importante da minha vida. Foi uma decisão que me marcou e que, acredito, me ajudou a chegar onde estou hoje.

- Depois segue para o Vilafranquense, no Campeonato de Portugal, e pouco tempo depois dá o salto para o Panetolikos, na Primeira Liga grega. Não é um percurso muito comum, sobretudo para um jogador que estava a iniciar a carreira sénior.

A verdade é que aconteceu tudo muito rápido. Estive cerca de cinco meses no Vilafranquense e foi uma experiência muito positiva. Acabámos por conseguir a subida nessa época. Eu já não estava no clube quando isso aconteceu, mas fiz parte do início do grupo.

Apesar de ter sido pouco tempo, foi uma etapa muito importante para mim. Era um contexto completamente diferente daquele que vinha da formação e da academia, e foi um verdadeiro choque de realidade. Percebi que o futebol não é só facilidades e que é preciso trabalhar muito, superar dificuldades e adaptar-me rapidamente. Esses meses ajudaram-me bastante a crescer.

Depois surgiu a oportunidade de ir para a Grécia. Foi algo inesperado, quase como se tivesse caído do céu, porque não é um salto normal. Não hesitei, arrisquei, e acredito que foi uma decisão acertada, porque acabou por correr bem.

Frederico Duarte viveu anos felizes no Panetolikos
Frederico Duarte viveu anos felizes no PanetolikosArquivo Pessoal

O terceiro jogador com mais jogos no Panetolikos: "Desfrutei verdadeiramente"

- Li a sua mensagem de despedida ao Panetolikos e percebe-se claramente a importância que teve para si. Além disso, é atualmente o terceiro jogador com mais jogos pelo clube e o segundo estrangeiro com mais jogos, o que mostra bem o peso dessa etapa na sua vida. Não é muito comum, sobretudo no estrangeiro, ver um jogador permanecer tantos anos num mesmo clube. Alguma explicação?

Foram anos muito bons da minha vida, que recordo sempre com enorme carinho. Criou-se ali uma ligação muito forte e ficou sempre aquele “bichinho” de um dia poder regressar. Fui acolhido como se fosse da família, desde o primeiro momento. Era uma cidade mais pequena, não uma capital nem uma grande metrópole, mas que vive intensamente o clube. Isso ajudou-me muito numa fase importante de crescimento, tanto a nível pessoal como profissional, e também no processo de adaptação.

Foram anos que desfrutei verdadeiramente. A minha família esteve sempre comigo, apoiou-me e também se sentiu muito bem ali. Sinceramente, não consigo lembrar-me de nada de negativo dessa experiência. Saí com uma imagem muito positiva e com um enorme respeito pelo clube e pelas pessoas. Mais do que o futebol, foram as pessoas que marcaram a diferença. Ajudaram-me a crescer e tiveram um papel importante na minha carreira. Gostava muito de um dia poder regressar, seja como jogador ou noutra função, nem que seja para voltar a ver essas pessoas e sentir-me, outra vez, em casa.

- Saiu a falar grego?

Saí a falar um bocadinho, sim. É verdade que escrever é muito difícil, mas a falar já me desenrasco bem.

- Termina contrato e acaba por dar um novo rumo à sua vida. Como é que foi esse processo de decisão na sua cabeça? Sendo um clube tão importante para si, imagino que não tenha sido fácil sair. Foi uma sensação semelhante à que teve quando deixou o Sporting?

Foi, claro, uma decisão difícil, porque era um clube ao qual estava muito ligado. Gostava muito da cidade, das pessoas e sentia-me realmente em casa. No entanto, acabou por ser, acima de tudo, uma decisão minha. Sentia que precisava de uma experiência nova e de dar um passo diferente na minha carreira.

Não encaro essa saída como uma questão de ser melhor ou pior em termos de qualidade. Foi mais a vontade de mudar, de conhecer uma nova cultura e de viver coisas diferentes. Poderia ter ficado, e teria todo o gosto nisso, mas naquele momento senti que era o passo certo a dar. Ao contrário do que aconteceu quando saí do Sporting, onde houve um sentimento maior de tristeza, aqui encaro a saída como um passo em frente. Saí em paz, feliz com tudo o que vivi, porque foram anos incríveis que vou sempre guardar comigo.

Frederico celebra os seus golos com um mortal
Frederico celebra os seus golos com um mortalArquivo Pessoal

"É mais fácil fazer um mortal do que marcar um golo"

- Voltando a Cracóvia e ao momento atual da época, há agora uma paragem importante antes do regresso à competição, em fevereiro. Este período também é fundamental para respirar um pouco, analisar o que foi feito nesta primeira fase e preparar o regresso em força?

Sim, claramente. Este período é muito importante para relaxarmos um pouco e limparmos a cabeça. Além disso, o inverno lá é bastante rigoroso e, nesta altura, não há mesmo condições para competir. Acaba por ser um momento positivo, sobretudo porque, ao contrário de outros campeonatos, não tivemos muito tempo de descanso no verão nem grandes férias. Esta paragem permite-nos recuperar física e mentalmente, refrescar ideias e preparar bem a segunda fase da temporada.

Vamos ter novamente uma pequena pré-época antes do regresso em fevereiro, o que é importante para voltarmos fortes e prontos para o que aí vem.

- Aos 26 anos, como é que olha para o futuro? Sabemos que, num plano mais imediato, o grande objetivo passa pela subida e por acompanhar o clube na primeira divisão...

É inevitável pensarmos em objetivos, tanto coletivos como individuais. Tento, no entanto, encarar as coisas sempre mais a curto prazo. Penso semana a semana, treino a treino, procurando melhorar todos os dias e superar-me em cada jogo em relação ao anterior.

Dito isto, é claro que a minha cabeça está muito focada na subida. É um objetivo importante para todos e também será um marco significativo na minha carreira. Não faz sentido dizer que não penso nisso. Ainda assim, acredito que a melhor forma de lá chegar é manter o foco no dia a dia, trabalhar bem e evoluir constantemente.

- Tenho aqui uma curiosidade. O Frederico festeja os seus golos com um mortal. Qual a explicação?

Posso dizer que é mais fácil fazer um mortal do que marcar um golo (risos). Venho de uma família muito ligada à ginástica: os meus pais praticavam, os meus irmãos também, e desde muito novo que fui habituado a passar tardes no ginásio a fazer mortais, cambalhotas e todo esse tipo de exercícios.

Aprendi desde pequeno e, durante alguns anos, conciliei o futebol com a ginástica. Mesmo quando estava no Sporting, fazia ginástica em paralelo, até por volta dos 13 ou 14 anos. Depois tive de escolher e optei pelo futebol, mas a ginástica ficou sempre um bocadinho comigo.

Sempre que posso, e sem arriscar demasiado, gosto de fazer essas “brincadeiras”. Sai-me de forma muito natural, quase como dar uma simples cambalhota, e acaba por ser um festejo diferente e engraçado.

- Ou seja, acaba por ser quase uma homenagem a outro desporto que, além de gostar muito, também tem um peso importante na sua família.

Exatamente. É uma forma de me relembrar dos bons anos que passei ligado à ginástica. Claro que tento sempre fazê-lo com o mínimo de risco possível, mas é um desporto de que gosto muito, que continuo a acompanhar e que faz parte da minha história. Sempre que posso, acabo por fazer essas pequenas “brincadeiras”.

- Sente que ganha também uma dimensão especial junto dos adeptos?

Sim, acho que gostam. Acaba por ser algo diferente e isso chama a atenção. No fundo, é mais uma forma de dar um pequeno espetáculo depois do golo. É apenas uma maneira de celebrar, como tantas outras, mas talvez um pouco mais vistosa, porque tem sempre aquele elemento de risco. Ainda assim, sinto que os adeptos se identificam com isso e encaram de forma positiva.

- Que mensagem gostaria de deixar, diretamente, aos adeptos?

Acima de tudo, espero que continuem a apoiar-nos como têm feito, não só na época passada, mas especialmente nesta primeira fase da temporada. Eles são, sem dúvida, o nosso décimo segundo jogador e têm um papel fundamental. Estão sempre presentes, seja em casa ou fora, semana após semana, e sentimo-lo dentro de campo. Da nossa parte, vamos continuar a dar tudo, a lutar em cada jogo e a honrar o clube e os adeptos. Com eles a apoiar fora e nós a responder dentro de campo, acredito que podemos criar uma ligação muito forte e alcançar o objetivo de subir e devolver o clube ao patamar onde merece estar.

Frederico Duarte rendido aos adeptos do Wisla
Frederico Duarte rendido aos adeptos do WislaČTK / imago sportfotodienst / Marcin Solarz/FotoPyK

A gratidão ao futebol: "Sinto-me um privilegiado"

- Não sabemos como será o futuro, mas podemos, de alguma forma, influenciá-lo. No dia em que terminar a carreira, o que é que gostaria de ouvir quando alguém perguntar: “Quem foi o Frederico?”

Acima de tudo, gostava que dissessem que fui uma pessoa e um jogador feliz, dentro e fora de campo. Alguém que transmitia boa energia aos colegas, aos adeptos e a todos os que me rodeavam. Claro que espero que reconheçam a minha qualidade como jogador, mas, acima disso, para mim é muito importante a marca humana que se deixa. Gostava de ser lembrado como alguém simpático, bem-disposto e fácil de lidar.

A verdade é que, ao longo da minha carreira, nunca tive problemas com ninguém, nem na Grécia nem na Polónia, e isso diz muito da forma como encaro as relações humanas. No fim de contas, somos todos pessoas, e é importante que gostem de nós não apenas pelo lado profissional, mas também pelo que deixamos como seres humanos.

- E se o futebol fosse uma pessoa, e tivesse a oportunidade de o conhecer pessoalmente, o que é que lhe diria?

Acima de tudo, diria obrigado. Obrigado por todos estes anos a fazer aquilo de que gosto e a desfrutar do meu trabalho, porque hoje em dia não é fácil amar a nossa profissão. Nós, enquanto futebolistas, somos privilegiados por fazermos aquilo de que gostamos e por estarmos ligados a algo que mexe com tantas pessoas, países, cidades e emoções. O futebol faz parte da minha vida e só posso estar grato por tudo o que me tem dado. Espero que continue a fazer parte do meu caminho por muitos mais anos.

Os próximos jogos do Wisla
Os próximos jogos do WislaFlashscore

- A sua carreira tem sido melhor do que alguma vez imaginou?

Sinto-me muito privilegiado. Claro que, ao longo da carreira, há altos e baixos e há momentos em que questionamos as escolhas que fazemos ou perguntamo-nos por que escolhemos este caminho ou por que estamos num determinado lugar. Isso faz parte. No balanço geral, sinto-me um privilegiado por ter tido a oportunidade de fazer aquilo de que gosto, a um bom nível, com boas condições e com pessoas que sempre me deram tudo para poder crescer. Nada me foi dado de graça, tive de trabalhar muito para isso, mas sei que há muita gente com talento que não tem as mesmas oportunidades. Por isso, olhando para tudo, só posso sentir gratidão por aquilo que o futebol me tem proporcionado.